(Sofia)
-Não
posso dizer que estava à espera porque seria mentir... –
Reagiu. –Acredito
que se estão juntos é porque se amam, e é o que mais importa. O
resto fica para trás das costas, o passado fica para trás das
costas! –
Diogo e Rita ficaram sem reação, de todas as possibilidades que
haviam pensado aquela estava longe de qualquer uma.
-Sofia,
desculpa todo o sofrimento que te causei. Sei que foi mau e não
imaginas o quão arrependida estou, a melhor forma de to provar é
fazer tudo para fazer o teu irmão feliz e dar-te a minha amizade.
-Alguém
me explica o que se passou? Não apanhei nada... –Queixou-se
Filipe.
Sofia
acabou por explicar o que se havia passado ao longo de um ano. Rita
tinha tornado a vida de Sofia ainda mais infernal no último ano
letivo e apesar de ter sofrido bastante por causa dela, acabou por
dar o braço a torcer em favor do irmão, se ele era feliz era o que
mais importava, iria fazer um esforço. Filipe admirou uma vez mais a
atitude dela, estava apaixonado e além de ser a sua melhor amiga,
tornava-se cada vez mais a sua fiel companheira, não só de momentos
de prazer como de momentos de pura felicidade e amor.
(Pedro)
Pedro
abriu a caixa do correio e deparou-se com uma série de cartas. Tudo
contas para pagar, era final do mês, desta vez vinham adiantadas,
mas uma outra carta lhe chamou à atenção: não tinha remetente,
nem um selo, não existia qualquer morada escrita, nem quem a
escreva. Podia ser uma ameaça ou qualquer outra coisa menos positiva
mas Pedro nunca pensara nisso. Talvez fosse apenas uma fã que lhe
escrevera uma carta ou talvez fosse Matilde que o quisera
surpreender. Subiu as escadas até sua casa e pousou todas as cartas
em cima da mesa da entrada, juntamente com a chave e o telemóvel. A
única coisa que lhe ficou na mão era a carta. Sentou-se no sofá e
começou a ler:
Querido
Pedro:
Faz
hoje um ano... Que parti.
Parti
sem me despedir ou sem me justificar. E por muito que tente explicar
as razões que me levaram a fazê-lo nunca iriam justificar o
injustificável. Foi um erro, e acredita que todos os dias me
arrependo do que fiz, chorei e choro todos os dias, à noitinha, a
pensar no sofrimento que te trouxe e não o merecias.
Possivelmente
já me esqueceste... Choro só de pensar nessa hipótese, mas é o
melhor que tens a fazer. Como é possível continuar a amar alguém
que nos magoa tanto? Alguém que não nos merece e que desaparece?
Alguém que não tem maturidade para assumir um erro e aceitar as
consequências do que fez? Mas agora estás feliz, é o que mais
importa. Estás com alguém que, de certeza, te ama de uma forma
incondicional. E que te merece de uma forma que eu nunca merecia, mas
assim como aceitaste todos os meus defeitos e lacunas, peço-te para
também a aceitares com todos os erros que ela possa cometer. Ela não
vai repetir os meus erros. Obrigada por dares mais uma oportunidade
ao amor, é um sentimento bonito e que nos faz lutar por tudo na
vida. Não somos ninguém sem o amor, assim como eu sem ti, não sou
nada. Acredita que apesar da distância que nos separava nunca deixei
de te amar.
Tenho
de te contar algo, que sei que vai fazer com que não me perdoes, mas
não consigo, simplesmente ocultar-te. Quando te abandonei estava
grávida. Existia um pequeno fruto do nosso amor. Um pequeno bebé
crescia no meu ventre, mas matei-o. Simbolicamente acabei por
chamá-lo Júnior, afinal ele era o nosso pequeno. Apesar de nunca
lhe ter visto as feições, sei que era parecido contigo, afinal como
era possível parecer-se com o monstro que é a mãe?
Quando
regressei ao Seixal a primeira coisa que quis fazer foi ver-te e
puder perder-me mais uma vez nos teus braços, sentir os teus lábios
a tocarem nos meus e ouvir-te dizer, nem que fosse uma última vez:
“Amo-te”, mas, por ser tão fraca, não o fiz. E quando te vi a
beijar a Matilde pela primeira vez... Senti o chão fugir-me dos pés
e acabei por ceder à uma tentação maior. Acabei por me envolver
com um amigo nosso, para o proteger, prefiro não dizer o nome dele,
e voltamos a repetir. Não sei se foi um erro ou não, mas sei que
quando o fazia me imaginava contigo. Era contigo que me imaginava a
viver momentos assim, e é contigo que quero voltar a repeti-lo,
porque é a ti que amo e prometo que vou lutar para sempre te ter ao
meu lado, apesar de saber que estás melhor sem mim. Não me peças
para te esquecer porque era como me pedires para viver sem ar.
Amo-te,
para sempre.
Sofia
Roch(inh)a
Pedro
não reagiu nada bem... Amachucou a folha e atirou-a ao chão,
agarrou no telemóvel, nas chaves e na carteira, saiu de casa sem
pensar ao certo até onde ia, só queria sair e reagir. Só podia ser
Filipe, era a única pessoa de quem ela se tinha aproximado à
exceção do irmão desde que voltara. Eles tinham que “pagar”
pelo que lhe tinham feito sofrer. Entrou no carro com as lágrimas
nos olhos e começou a percorrer várias ruas à procura deles. Assim
que os viu, estacionou o carro, apesar de o ter feito mal e
aproximou-se, em primeiro lugar de Sofia:
-Metes-me
nojo! -
Disse olhando nos olhos de Sofia, que ficou surpreendida pelo olhar
dele. Não demonstrava um enorme vazio, nem amor, demonstrava apenas
uma raiva e um ódio que ela nunca tinha visto e que nem ela sentira
pelo pai quando ele a obrigara a abortar.
Afastou-se
e foi em direção a Filipe:
-Nunca
mais me dirijas a palavra!
Ao
contrário de Sofia, Filipe reagiu, enquanto Pedro se afastava deles,
Filipe agarrou no braço de Pedro e fê-lo voltar-se para si.
-Não
podes chegar aqui e fazer isto, estás bom da tua cabeça? –
Pedro colocou toda a força que tinha no pulso direito e deu um soco
a Filipe, que não se deixou calar e respondeu-lhe da mesma forma.
-Parem!
Por favor parem! –
Gritava Sofia tentando separá-los e também ela acabava por sofrer
na pele aquela violência.
Só
acabaram por separar-se quando várias pessoas que passavam na rua
perceberam a aflição em que Sofia se encontrava e a luta que
existia entre ambos, e quando ela ameaçou que chamava a polícia é
que acabaram por se afastar.
-Isto
não fica assim, ouviste Filipe? Nunca te vou perdoar teres dormido
com a Sofia ouviste? Afasta-te! –
Sofia aproximou-se de Pedro tentando explicar o porquê deles terem
dormido juntos, mas ele não a deixou tocar-lhe e continuou. –Se
gostas de mim, por favor, esquece-me e sai da minha vida.
Sofia
afastou-se de Pedro, sem saber ao certo como reagir, ele tinha pedido
para sair da vida dele? Tinha-lhe pedido para o esquecer? Porque é
que Pedro se haveria exaltado tanto ao saber que ela havia dormido
com Filipe?
-Filipe
como estás? –
Perguntou aproximando-se dele que limpava o sangue que lhe sai-a da
boca.
-Porque
é que lhe contaste? Podias bem ter evitado tudo isto... –
Também Filipe estava magoado com Sofia e ela sentia-se perdida.
Deixou ambos afastarem-se de si e sentou-se no chão, aquela dor que
preenchia o seu peito era bem maior que a dor física que os cortes
que tinha feito nos pulsos lhe fizeram.
-Sim?
-Diogo...
–
Sofia controlou ao máximo as lágrimas tentando falar por chamada
com o irmão.
-Sofia?
Tiveste a chorar?
-O
Pedro... O Filipe... –
Não conseguia dizer uma frase inteira, tentava controlar as lágrimas
mas era quase natural elas rolarem pelas suas bochechas como o
simples respirar.
-Onde
estás?
-Ao
pé do Rio Sul.
-Dois
minutos e estou aí.
Aqueles
minutos que Diogo demorou até chegar próximo da irmã pareciam-lhe
horas... Ela sentia-se sozinha e sufocar com a dor, mas havia
prometido não se voltar a cortar e ia cumprir. Mas iria ultrapassar
mais um momento difícil, podia ter perdido Filipe, mas iria
recuperá-lo, assim como iria recuperar Pedro, ela era lutadora e
persistente, nunca caminharia sozinha, tinha sempre a família a seu
lado, tinha o irmão e agora tinha juntamente com a mãe, o pai.
-Sofia!
–
Disse Diogo correndo até ela.
-Diogo!
–
Levantou-se e abraçou-o. O rapaz pegou na irmã ao colo e colocou-a
no interior
do carro. –É
melhor ficarmos aqui para pudermos falar mais à vontade, ninguém
tem nada haver connosco. –
Depois de esperarem alguns minutos, os suficientes para Sofia se
acalmar nos braços do irmão, ela decidiu falar.
-O
Pedro e o Filipe andaram à porrada.
-Eu
sei. E tenho a certeza que foi algo que tinha haver contigo.
-O
Pedro sabe que eu e o Pipo nos envolvemos.
-Eu
sempre vos avisei que isso não ia correr bem...
-Achas
que nós não sabíamos os perigos que corríamos desde o início?!
Mas nunca
esperei que ele reagisse assim.
-Eu
provavelmente reagiria da mesma forma, descobrir que um amigo meu,
que me viu sofrer por causa de uma rapariga e no final eles andavam a
aquecer os pés um ao outro.
-O
Pedro não descobriu, fui eu que lhe contei.
-O
QUÊ?! –
Respondeu Diogo, com vários decibéis acima do normal. –Porquê
Sofia? Porquê? Tens noção dos problemas que causaste?
-Eu
devia uma justificação ao Pedro, e dei-lha, apenas isso!
-Não
Sofia, não foi apenas isso. Tu fizeste com que eles andassem à
porrada, tu
fizeste com que eles fossem castigo, tu fizeste com que
dois amigos e colegas de equipa se tornassem inimigos.
-Eu
não podia simplesmente ficar calada, não podia omitir isto do
Pedro.
-Tu
perdeste o Pedro para sempre, depois disto Sofia. –
Ficou sem reação possível, o irmão sempre a tinha apoiado e dado
forças quando mais ninguém lhe dera, mas aquelas palavras ainda lhe
doeram mais que o primeiro soco que Pedro dera a Filipe, até o irmão
acreditara que ele desistira de si?!
Diogo
entrou para o lugar do condutor e começou a conduzir, Sofia sabia
que o mais certo era irem até à sua casa nova, mas existia ainda
uma esperança de ir até à casa da família Nascimento, estava de
cabeça quente mas não desistia de falar com Filipe, ele também
precisava de uma justificação. Mas o irmão decidiu ir até à nova
casa e apesar de querer refilar, calou-se, sabia que o irmão, como
ninguém, sabia o que era melhor para si. Estacionou o carro na
garagem do prédio.
-A
Rita está em casa, vai lá ter com ela, eu vou a casa do Filipe
buscar as tuas coisas, a partir de hoje mudas-te de armas e bagagens
para cá.
-Diogo,
eu não queria nada disto, juro, acredita em mim!
-Eu
sei, Sofia, mas acidentalmente ou não, acabas por desiludir e
magoar.
Sofia
saiu do carro com a consciência pesada e com o coração apertado,
tinha feito tudo apenas com o intuito de contar a verdade, mas os
seus planos sairam-lhe completamente errados, ela acabara por magoar
todos à sua volta, inclusivé o próprio irmão. Subiu até à
entrada de sua casa e tocou à campainha, esperou alguns segundos e
Rita abriu-lhe a porta.
-Minha
querida! –
Abraçou-a e deu-lhe um beijo na testa. –Que
se passou? –
Apesar de estar a fazer um esforço para perdoar, esquecer e para
começar a confiar em Rita, Sofia simplesmente não estava no dia
ideal para o fazer.
-Desculpa
Rita, mas vou-me deitar, estou demasiado cansada para falar sobre o
que se passou. –
Virou costas e foi deitar-se em cima da cama do seu novo quarto,
estranhava aquele quarto, aquelas cores e a falta de companhia mas
teria de se habituar a viver assim.
Poucos segundos depois adormeceu.
Passado
algumas horas Sofia acordou...
-Afinal
o que é que se passou com a tua irmã, Diogo?
-O
Pedro descobriu que o Filipe e a Sofia aqueciam os pés um ao outro,
digamos.
-Como
é que ele descobriu isso?
-Foi
a Sofia que lhe contou?
-Sim,
faz hoje um ano que eles se separaram e ela escreveu uma carta e
contou isso, não entendo porquê, por muito que tente perceber.
-Por
um lado eu entendo o que ela tentou fazer...
-Por
muito que tente compreender, simplesmente não consigo.
-Diogo.
– Fez
uma curta pausa. –As
raparigas são muito mais sentimentais que os rapazes, enquanto tu
estás a pensar com a cabeça e não estás a perceber, eu estou a
tentar escutá-la com o coração e estou a entendê-la. –
Respirou fundo. –
A Sofia sente que ainda está numa relação com o Pedro, até porque
ela ainda o ama e como tal, exatamente hoje que fez um ano em que o
abandonou, tinha de lhe escrever uma carta a contar tudo. E apesar de
não a ter lido, quase que aposto que se culpou por tudo, tanto pelo
aborto, como pela fuga, sem nunca acusar o pai e ainda te defendeu. A
tua irmã só fez o que o coração lhe disse e não deu ouvidos ao
coração.
-E
o Filipe insere-se no meio disso? É cabeça ou coração?
-Amor,
não sejas tão exigente com a tua irmã.
-Quero
o melhor para a minha irmã e estes problemas vão fazer-lhe tudo
menos bem.
-Eu
sei que te custa ver a tua irmã a sofrer, mas ela assim como tu, vai
cair e vai levantar-se! –
Sorriu. –
As rochinhas são rochas pequeninas, vão ao chão mas não partem,
enquanto os Rochinha são pequeninos de tamanho mas grandes de
coração, vão ao chão mas não partem, sabias?
-Claro!
–
Respondeu Sofia aparecendo na sala e juntando-se ao casal. –Sabes
Diogo? Qualquer um de nós, pode passar dificuldades, pode passar
fases muito más, ou muito boas, mas vamos estar sempre juntos! –
Deu um enorme abraço ao irmão e deu-lhe um beijo na testa.
-E
a Rita, maninha?
-A
Rita já é uma Rochinha, esqueceste-te? –
Sorriram, para Rita a partir do momento em que Diogo e Rita começaram
a namorar, ela tornara-se parte da família.
Depois
de alguma conversa, acabaram por decidir encomendar pizza para o
jantar. Todos precisavam de recuperar energias e nada melhor que
pizza para colmatar o bicho da fome que se apoderava entre eles.
Colocaram a mesa enquanto esperavam que a comida fosse entregue, e
mal chegou até casa, desaparecera, tamanha era a fome.
Depois
de arrumarem e limparem a cozinha, Sofia foi vestir o pijama e ia
deitar-se, precisava de descansar e só a dormir conseguia esquecer
toda a confusão que a vida se tornara, mas assim que pousou a cabeça
na almofada ouviu a campainha tocar.
-Eu
vou lá. –
Informou Diogo. Abriu a porta e não tardou a reagir. –Que
estás aqui a fazer, Filipe? –Sofia
sentou-se na cama surpreendida, mas sem levantar os pés da cama, não
iria sair de onde estava, iria esperara para ver o que sucedia.
-Quero
falar com a tua irmã. –
Respondeu calmamente.
Será
que Diogo vai permitir?