domingo, 23 de março de 2014

Capítulo 02: “É uma longa história...”


-Sofia. – Disse com uma calma característica que possuía. – Tu tens noção do que estás a fazer? Do que estás a deixar para trás?

-Tenho, Diogo. Sei bem o que estou a fazer. Estou a lutar pela minha felicidade. E infelizmente, ao contrário do que sempre sonhei, a minha felicidade é longe do homem que chamas pai. Estou a deixar amigos e mais importante, os meus avôs e a minha mãe, mas não vou desistir sabes porquê? Porque ás vezes é preciso dar um passo atrás para, mais tarde, dar dois para a frente. Não vai ser fácil, vou ter que estudar e trabalhar para conseguir ter um tecto sobre qual dormir e comida, nem que seja só para ter uma refeição diária. Mas não vou desistir de viver, e em Espinho eu limitei-me a sobreviver.

-Só quero que tu percebas que nada está como tu deixaste e que muitas das coisas que até podias dar como certas, já não estão assim. Quero que percebas isso para evitar que sofras.

-Sei que não vai ser fácil, mas estou disposta a lutar. Não é apenas pelo Pedro, é pelos amigos que cá deixei como o Filipe, mas ainda mais em especial por ti Diogo, sei que não estarei sozinha se te viver á minha beira.

-Em Espinho também não estás sozinha, porque independentemente dos quilómetros que nos separem tens-me a apoiar-te, além dos teus amigos de infância, e também os avós e a mãe, e o pai apesar de tudo também.

-Tu sabes que não é bem assim. Os amigos, se forem verdadeiros não os perco, os avós sabem que os admiro muito e que estarão sempre no meu coração e a mãe... Ela não sabe onde estou mas eu deixei-lhe uma carta.

-Tu fugiste? – Perguntou incrédulo.

-Sim. Tive o último ano a poupar dinheiro suficiente para pagar a viagem para cá e tenho dinheiro para sobreviver durante uns tempos, não é muito mas chega.

-Só quero que percebas que por aqui as coisas também não são fáceis. Continuo a viver no Caixa por enquanto, mas estou á procura de uma casa para ir viver com o Filipe. Logo não te consigo dar uma casa e o dinheiro que ganho também não é muito. Mas dá para os dois, mas sem grandes luxos.

-Já pedi transferência para a minha escola antiga, senão ficava aqui a dormir pelas ruas ou assim e ia para a escola.

-Não. Eu ajudo-te, e apoio. Não te vou abandonar nem hoje, nem nunca. Só que me apanhaste desprevenido, nem tudo é tão fácil.

-Eu sei bem que não é fácil, Diogo. Não conheces a minha luta diária e ao longo do último ano. Aprendi que passo um obstáculo e logo de seguida vem um maior. Mas não vou desistir Diogo, não vou voltar para lá.

-Tu vais aprender com os teus próprios erros, vais entender que nem tudo é como pensas e que há lutas que não são para tu travares e que o passado está morto e enterrado.

-Diogo, não sou infantil a esse ponto. Conheço-te e sei que há algo que não me queres ou não consegues contar, mas não vou insistir. Quero apenas saber se conto contigo para me apoiares.

-Sem dúvida, aconteça o que acontecer não te vou deixar ficar mal, mana. Deixa-me só perguntar ao Filipe se podes ir almoçar a casa dele. – Pousou a mão sobre o telefone e trocou dois dedos de conversa com o amigo. – Eu mando-te a morada por mensagem, apanhas um táxi e vais lá ter pode ser?

-Sim, claro. Vai mais alguém convosco? – Perguntou ansiosa por saber se iria matar saudades de uma das pessoas que mais gostara na vida.

-Não Sofia, ele não vai connosco. Nem ele nem mais ninguém.

-Depois eu mato as saudades todas juntas! Não acredito vou estar com o Pipo! – Filipe era um dos amigos que Sofia mais lamentava de se ter afastado, era um verdadeiro amigo e companheiro. Por mais que uma vez disse-lhe que era como um irmão de sangue.

-E vais matar saudades minhas, não estás feliz? – Perguntou Diogo com uma pontinha de ciúmes.

-Ainda a semana passada te vi! – Respondeu brincando com o irmão. – Sabes perfeitamente que a pessoa que morro mais de saudades és tu!
-Eu bem que sabia, tu amas-me!

-Tu amas-me mais!

Acabaram por se despedirem pouco depois e Sofia pediu ao irmão para ser ela a surpreender Filipe.  Não era o primeiro grande desafio que enfrentava naquele dia. Tinha abandonado Espinho no mesmo dia, e grande parte da viagem de comboio fê-la a tentar arranjar um plano para refazer a sua vida, mas sabia que a partir do momento em que chegaria a Lisboa iriam existir milhões de outros conflitos e lutas, e a sua principal guerra era reconquistar a vida que tivera.

Acabou por dar a morada ao taxista e a partir em direção a casa do amigo. A viagem foi tranquila e nada conversadora, Sofia gostava muito de conversar e de ter uma boa e grande conversa mas desta vez não conseguiu falar com o também simpático taxista. Estava demasiado pensativa para o fazer. O irmão estava a esconder-lhe algo e ela queria saber o que era. Assim que chegou a casa do amigo, pagou ao taxista e começou a retirar as malas para fora do carro e contou com ajuda do condutor. Pareciam muitas malas e muita bagagem, mas para ela era pouco. Sentiu que tudo o que a representava estava ali. E apenas ali. E os dois objetos que trazia na mão direita, eram os que mais significado que tinham para si.  



Pedro comprou dois ursinhos de peluche semelhantes, guardou um e deu outro a Sofia. Comprou também dois anéis de prata. No interior existia a descição “23”, que representava mais que um número para aquele casal. Pedro havia nascido a 23 de Janeiro, e Sofia a 2 de Março (2/3), embora a sua data prevista de nascimento fosse a 22 de Abril (nasceu prematura), começaram também a namorar no 15ºaniversário de Sofia.  Por isso 23 era o número predilecto de ambos e significava muito e só conseguiam chegar a uma conclusão: se no passado, as vidas se haviam cruzado, nem que fosse por números, então o futuro também estava unido. Desde que o abandonara que não tinha voltado a tirar aquele anel do seu dedo anelar da mão direita e o peluche andava sempre na sua mão, todos os dias, a todas as horas.
Esperou alguns minutos pelos “irmãos” e enquanto Diogo acabava de estacionar o carro, Filipe saiu do carro, ainda em andamento e correu até aos braços da amiga e deram um abraço forte.

-Que saudades tuas Soff! – Era uma das alcunhas carinhosas que Filipe tinha dado a Sofia.

-E eu tuas Pipo! – Sofia ao contrário de todos os outros, não o tratava pelo nome, mas pelo alcunha que lhe dera.

-Que é que feito de ti boneca? Há mais de um ano que não tenho notícias tuas. – Disse pousando a amiga no chão depois do forte abraço que lhe deu.

-Há menos de um ano, fica sabendo. É uma longa história, depois conto-te. E tu como tens andado?

-Agora o que menos interessa sou eu, Soff. – Olhou para Sofia e admirou as suas diferenças. – Mas tenho que te dizer que este último ano fez-te bem. Olha só para ti, estás uma mulherzinha!

-Bem, acredita que não fez. Mas como te disse é uma longa história, estou muito diferente, cresci muito este último ano.

-Já percebi isso. Cadê o teu sorriso de antes? – Disse tentando imitar o sotaque brasileiro, mas como sempre, não lhe correra nada bem. Sofia sorriu timidamente e respondeu:

-Não mudaste nada! Quer dizer... Continuas a mesma pessoa, porque o teu corpo também desenvolveu bastante. Estás um homem! – Filipe sorriu envergonhadamente. Mas aquele momento constrangedor acabou por ser interrompido por Diogo.

-Já vi que tinhas mais saudades do teu maninho que do teu mano! – Disse enciumado Diogo.
Sofia surpreendeu-os e abraçou os dois em simultâneo. Sussurrou-lhes:

-Vocês são uma das razões pelas quais voltei! – Deu um beijinho na bochecha de cada um e passado alguns segundos soltou-os dos seus braços. Eram bom regressar até junto dos seus amigos, lutar pela sua felicidade e simplesmente sentira mais durante aqueles minutos, do que durante o último ano de vida
Dividiram as malas por todos e foram até casa de Filipe, por sorte, tinham trazido o almoço e até o terminarem foi rápido. Depois de lavarem a loiça e de arrumarem a cozinha, foram até á sala. No mesmo sofá sentaram-se Filipe á esquerda, Sofia no meio e mais á direita estava Diogo. Estava na altura de contar tudo:

-Pipo, acho que tens o direito de saber porque é que eu fugi e só regressei agora... E tu Diogo, mereças saber toda a verdade também. – Respondeu com frontalidade mas também com mágoa, sabia que tinham o direito de saber toda a verdade mas não era fácil contá-la e muito menos, no mesmo dia em que deixara Espinho.

-Sofia, aconteça o que acontecer, estarei ao teu lado, a apoiar-te e a ajudar-te. Pelo que percebi não é fácil, podes guardar para ti e um dia mais tarde, quando tiveres coragem e sem mágoa na voz, contas. – Respondeu Filipe calmamente.  

-Vocês têm de saber tudo, merecem como ninguém. – Respirou fundo e beijou o anel, apertou bastante o peluche, a quem chamava Miguel, que era o segundo nome de Pedro e continuou. – Eu mudei muito neste último ano, aprendi a ver as coisas de forma diferente e que a vida trás-nos sempre obstáculos, até de onde não esperamos. Há um ano atrás, estive grávida. – Fez uma breve pausa. – Mas perdi o bebé. Não, eu matei o meu filho. Tive a minha oportunidade de realizar o meu sonho de ser mãe, mas desperdicei-a. O homem que me fez – Desde o que acontecera nunca mais o tinha chamado de pai. Obrigou-me a abortar e a matar um ser que vivia no meu ventre que não tinha culpa nenhuma de ter vida, de ter sido formado. Mas a culpa foi minha, se eu tivesse lutado mais, talvez hoje fossemos uma família, eu, o meu filho e o pai. Mas as maldades daquele homem não ficaram por aí. – Engoliu em seco. – Ele obrigou-me a abandonar tudo e a limitar-me a ir embora sem poder dizer nada a ninguém. Não me pude despedir ou lutar contra isso. – Limpou as lágrimas que atravessavam o rosto. – E não consegui viver com tudo. Tentei ser feliz em Espinho, a sério que tentei, mas não consegui. E por isso... – Apontou para os pulsos onde foi visível os cortes que tinha nos pulsos que nunca desapareceriam. – Cortei-me, mas o meu corpo venceu a minha alma e não morri, mas não desisti. Tentei matar-me duas vezes no mar. – Diogo e Filipe eram as primeiras pessoas com quem Sofia tinha partilhado esta informação. -Mas fui tão fraca que nem consegui matar o maior monstro que conheço. – Apontou para si mesma. – Mereço sofrer desta forma, e de todas as torturas que existem. Mas não os que amo. E por isso, no último ano tentei ao máximo poupar dinheiro para voltar para me certificar que os que amo são felizes, sem mim, mas com uma justificação para tudo o que aconteceu e por vos ter abandonado. – Disse sem conseguir conter as lágrimas. Podia passar um ano, ou uma vida, Sofia nunca se iria perdoar pelo que fizera e pela mágoa que causara aos que amava. Em especial a Pedro e sentir que deixava o filho orgulhoso no céu.

Como irão reagir Diogo e Filipe?
Será que vão continuar a apoiá-la? Será que vai encontrar reconquistar a felicidade? 

7 comentários:

  1. Olá. Amei...amei *.*
    Espero q o Diogo e o Filipe reagam bem pq a Sofia não teve hipótese de fazer fosse o q fosse
    Espero bem q a continuem a apoiar e espero q ela consiga reencontrar a felicidade.
    Espero pelo próximo sff bjs

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  2. Olá :)
    Já andava à uns dias para começar a ler esta fic, mas com o pouco tempo que tinha não deu. Depois falaste-me de toda a história e olha, cá estou eu :D
    São os dois primeiros capítulos mais emotivos que alguma vez li. Sem sombra de dúvidas que tens aqui uma história que vai dar pano para mangas. A Sofia é uma lutadora, eu acredito que sim. Ela está a lutar por aquilo que quer: felicidade. Tentou matar-te? Só a admiro ainda mais. É preciso ter coragem para querer acabar com a vida. São imensas as pessoas que o querem fazer, mas são pouquíssimas aquelas que tentam.
    Espero que o Diogo e o Filipe a continuem a apoiar e a ajudá-la a encontrar a felicidade que merece, junto deles.
    Que venha o 3º, o 4º, o 10º, o 100º! Irei tentar acompanhar sempre a história na hora e deixar os meus comentários.

    Espero o próximo guapa.
    Beijinhos.
    Ana Patrícia.

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  3. Olá

    Adorei , desde a primeira letrinha que me cativou esta história :)
    Vou acompanhar-te concerteza *_*


    Beijinhos


    Catarina

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  4. Olá!
    Bem a Sofia bem que precisa de coragem para enfrentar tudo o que vem por aí!
    Porque é que eu tenho a sensação que o Pedro refez a sua vida e já não está sozinho?
    Espero o próximo guapa!

    Beso
    Ana Santos

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  5. Olá!
    Se já tinha gostado imenso de ler o primeiro capitulo o segundo prendeu-me por completo!Adoro a Sofia e a sua forte personalidade!
    Espero que o Diogo e o Filipe reagem bem e que continuem a apoiá-la pois ela bem merece!:)
    Quero mais!
    Beijinhos
    Rita

    ps-e desculpa só ter comentado agora :P

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  6. Eu gostei muito dos dois capítulos. Aguardando o terceiro, linda. Escrever muito bem. Beijinhos :))

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  7. Olá

    Adorei , acho que a Sofia fez muito bem contar ao irmão e ao amigo tudo pelo que passou , eles mereciam saber e também a ela própria lhe fez bem ...

    Mais *_*


    Beijinhos


    Catarina


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